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Estudo aponta que apenas 9% dos estabelecimentos cumprem com medidas de segurança

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data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Renan Mattos (Diário)

O problema é ser reativo e não preventivo. A avaliação é do professor doutor Rogério Cattelan Antocheves de Lima, do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil da UFSM. Ou seja, a sociedade, na maioria das vezes, reage a uma situação ao invés de investir em prevenção. No final de 2019, a doutoranda Juliane da Silva Dávila e a mestranda Mariana de Moraes Righi, sob orientação de Antocheves, realizaram um trabalho de campo para saber, na prática, se Santa Maria aprendeu com a tragédia. 

Foram, ao todo, percorridos 65 estabelecimentos (comerciais, educacionais, locais de reunião de público e de serviços profissionais) para verificar se as medidas mínimas de segurança contra incêndio - exigidas para qualquer edificação e previstas num PPCI - estão sendo cumpridas. Os pesquisadores observaram os seguintes quesitos: Alvará de Prevenção e Proteção Contra Incêndio (APPCI) afixado em local visível; iluminação de emergência; sinalização de emergência e extintor de incêndio.

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Ao término do trabalho, foi constatado que "o município ainda não demonstra ter aprendido, de forma efetiva, com os erros". Antocheves afirma que houve ligeiro avanço, de forma geral, junto à sociedade que passou a estar mais vigilante. Contudo, ele ressalva:

- Após o incêndio, a sociedade ficou mais atenta à segurança contra incêndio. Porém, com o passar dos anos, a tendência é que as pessoas acabem esquecendo e voltando aos hábitos antigos. Por isso, precisamos que a segurança contra incêndio esteja sempre em pauta, que a sociedade entenda que este tema é extremamente relevante e com impacto direto na vida humana. Seria importante que se estabelecesse uma cultura prevencionista, através de exercícios periódicos de evacuação de locais de grande concentração e circulação de pessoas, para que os frequentadores estivessem mais preparados no caso de ocorrência de um sinistro.

MAPEAMENTO
O estudo aponta que, "do total de locais visitados, apenas 9,23% cumpriram todas as medidas mínimas de segurança contra incêndio". Além disso, "a maior parte dos estabelecimentos contemplou somente algumas das medidas avaliadas". O levantamento detalha que destes, "63,08% atenderam mais de 50% das medidas e 24,62% cumpriram até 50%. E cerca de 3,08% não apresentavam nenhuma medida de segurança". 

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ANTES MESMO DO INCÊNDIO, CIDADE JÁ CONTAVA COM LEI  
Ainda em janeiro de 1991, 22 anos antes do que viria a ser o maior incêndio do Estado e que faria Santa Maria ser conhecida no noticiário nacional e mundial, o Executivo local passava a contar com uma lei municipal (nº 3301/91) para tratar acerca das obrigações e normas de prevenção contra incêndios em bares, boates, restaurantes e outros locais como circulação de pessoas. O responsável pelo Setor de Fiscalização da prefeitura, Marcio Abbade, explica que houve "uma mudança considerável após a tragédia". 

Segundo ele, antes mesmo de ser promulgada a Lei Kiss Estadual, em 2013 - e que foi prorrogada pelo governador Eduardo Leite (PSDB), no fim do ano passado, por mais 4 anos (até 27 de dezembro de 2023) -, "os proprietários das casas noturnas, por iniciativa própria, já começaram a buscar soluções a evacuação dos locais".

- Muitas casas noturnas adotaram práticas como a abertura de portas secundárias de emergência para facilitar o fluxo dos frequentadores. Outro fator positivo são os alarmes e dispositivos instalados nas casas noturnas, que são acionados automaticamente mediante fumaça ou, até mesmo, manualmente. Algumas casas noturnas, além desse sistema, têm exaustores de grande porte e hidrantes para auxiliar no combate ao incêndio - diz Marcio Abbade.

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Quanto à documentação, o superintendente enfatiza que os alvarás (sanitário e de localização) devem ficar expostos em local visível. Além disso, soma-se a exigência do alvará dos bombeiros, "com destaque à indicação da capacidade máxima do local, que deve estar, preferencialmente, junto à entrada principal do estabelecimento, para facilitar o acesso à informação para o frequentador", detalha. 

LEGISLAÇÃO PRORROGADA
Com a prorrogação da Lei Kiss, as edificações com Alvará de Prevenção e Proteção Contra Incêndio (APPCI) válido com base na lei vigente poderão renovar o APPCI uma única vez, não podendo sua validade ultrapassar a nova data. Nesses casos, ainda existe o prazo de até dois anos para protocolar o Plano de Prevenção Contra Incêndios (PPCI), sendo, no mínimo, dois meses antes da data final de validade do APPCI em vigor.

Situação é criticada por Flávio Silva, presidente da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria:

- As leis existem e foram aprovadas, mas não temos gestores, seja no município, no Estado ou no país, qualquer estadista que vá fazer fiscalização e que verifique se as leis realmente são cumpridas. Santa Maria não avançou muito neste sentido. Era para estarmos vendendo exemplo em prevenção e normas de segurança. Ano passado, o governador nos premiou com um retrocesso. Quando restavam dias para apertar o cumprimento da Lei Kiss, ele acabou prorrogando a legislação por quatro anos. A prorrogação foi uma justificativa que só beneficiou empresários, foi vergonhoso.   

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PLACAR
Já em referência à questão que trata da colocação de painéis para a contagem simultânea do público no local, Abbade ressalva que a matéria terá de ser discutida, novamente, junto ao Legislativo local. E assim passar por adequações para que não se torne uma lei inócua. Em 2017, o projeto de lei tornou-se Lei Complementar. Acontece que muitos empresários afirmam que há dificuldade encontrarem esse dispositivo no mercado.  

- Uma vez que ele seria vulnerável à manipulação. Agora, a ideia é que se tenha a adoção de um novo dispositivo com essa finalidade, o que está sendo estudado - explica o superintendente. 

AVANÇOS
Presidente da Sociedade de Engenharia e Arquitetura de Santa Maria (SEASM), o engenheiro civil Eduardo Tocchetto, avalia que o saldo pós-Kiss é positivo:

- As mudanças foram muitas, principalmente na legislação que ficou mais exigente quanto aos sistemas de prevenção de incêndio, acessibilidade e um maior rigor nas fiscalizações. 

MUDANÇA CULTURAL
O comandante do 4º Batalhão Bombeiros Militar, major Marcio Farias, avalia que Santa Maria "já é hoje e segue dando passos para se consolidar" como uma referência em questões de prevenção de incêndio. Ele destaca que a Lei Kiss estadual deu maior agilidade, por exemplo, na liberação de alvarás e modificou obrigações de empreendimentos de baixo e médio risco de incêndio. O comandante comenta também o Certificado de Licenciamento do Corpo de Bombeiros (CLCB), documento online que permite o funcionamento de empreendimentos de baixo e médio risco com até 200 metros quadrados.

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O major cita outro avanço da nova lei que é a parte que considera a chamada carga de incêndio dos prédios. Isso quer dizer que passa a ser observado o material usado dentro de uma edificação e o potencial inflamável. O comandante cita, com um exemplo, outro avanço:

- Antes (da Lei Kiss), a questão das saídas deixava dúvida. Era comum, por exemplo, duas saídas ficarem na mesma direção. Hoje, as saídas estão em paredes diferentes e em direções diferentes. Há, é bom que se diga, a iluminação fixada no chão que leva até a saída. Igualmente obrigatório está o detector de fumaça. Esses são apenas alguns exemplos. O principal, entendo, é a mudança cultural da sociedade, do empresariado e do poder público. 

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